ATENTADOS NA ÍNDIA
Terrorismo sem fronteiras é o lado perverso da
globalização.
A presidente da Índia, Pratibha Patil, visita vítimas
dos ataques terroristas ocorridos em Mumbai
Cenas de carnificina protagonizadas por jovens mal saídos da
adolescência se
tornaram rotina em países da Europa, Ásia e África, vitimando
pessoas inocentes em
uma guerra sem nacionalidade, movida pela intolerância religiosa.
No mais recente episódio, dez terroristas invadiram na semana
passada dois hotéis de
luxo, uma estação de trem e atacaram outros sete pontos em Mumbai
(antiga
Bombaim), capital financeira da Índia e maior cidade do país, com
20 milhões de
habitantes.
Após três dias de violência, deixaram quase 200 mortos e dezenas
de feridos,
aumentando também a tensão política na região.
É como se a avenida Paulista, no centro de São Paulo, fosse tomada
por criminosos
com o único objetivo de matar o maior número de pessoas que
encontrassem pela
frente. No caso da Índia, o componente explosivo que provoca
conflitos na região são
diferenças religiosas acirradas por um ódio com raízes históricas.
11 de setembro indiano
Apesar de ser comumente caracterizado como povo pacífico, segundo
a tradição do
líder Mahatma Gandhi (1869-1948), os indianos vivem uma guerra sem
fim,
semelhante àquela travada entre palestinos e judeus no Oriente
Médio.
O que os ataques terroristas a Mumbai - chamados de "11 de
Setembro indiano" em
alusão aos atentados em 2001 nos Estados Unidos - tiveram de
diferente em relação
aos anteriores, foi o fato de terem atingido os mais ricos.
No luxuoso Taj Mahal Palace & Tower Hotel, terroristas armados
de granadas e fuzis
invadiram quartos e executaram friamente turistas, principalmente
americanos e
ingleses. E, como é comum neste tipo de ação conduzida por
fanáticos, não houve
exigências e todos, com exceção de um, acabaram mortos pela
polícia.
Foram os piores atentados desde a morte de mais de 200 pessoas em
explosões de
bombas ocorridas em 2006.
Para as autoridades indianas, há indícios de que o grupo
terrorista recebeu
planejamento e treinamento militar no país vizinho e eterno
inimigo, o Paquistão.
Ambos os países possuem armamentos nucleares, o que torna a
situação ainda mais
perigosa.
Vizinhos em guerra
A origem dos conflitos entre Índia e Paquistão remonta a 1947,
quando as duas excolônias
inglesas se tornaram independentes.
A Índia, o segundo país mais populoso do mundo (só perde para a
China) com 1,14
bilhões de habitantes, tem maioria hindu (82%), diferente do
Paquistão, com maioria
mulçumana sunita (77% da população). Por causa deste antagonismo
religioso, os
territórios se separaram em países autônomos, sem conseguir
resolver problemas
internos.
Desde então, investiram milhões em armamento e travaram três
guerras, duas delas
motivadas pelo controle da Caxemira, Estado indiano de maioria
islâmica. Além das
guerras, os dois países são alvos, há décadas, de atentados
terroristas que mataram
milhares de habitantes locais e estrangeiros.
Há suspeitas de envolvimento nos ataques de Mumbai de uma milícia
que luta pela
independência da Caxemira e que atacou o Parlamento indiano em 2001,
quase
levando Índia e Paquistão a uma quarta guerra.
Com este histórico de desavenças, é normal que haja, entre a
população dos dois
países, ódios mútuos, reavivados em momentos de crise. Mas o que
está em jogo no
incidente atual?
Estados Unidos
O que torna a recente situação mais dramática é o eventual fim do
diálogo iniciado
com a posse do presidente paquistanês Asif Ali Zardari (viúvo de
Benazir Bhutto, exprimeira
ministra assassinada em 2007), que fez críticas contundentes aos
radicais
islâmicos, alguns dos quais ocupando postos no alto escalão das
Forças Armadas.
Ou seja, a onda de violência acontece bem em meio a um delicado
processo de paz
entre os países, que agora corre o risco de ser suspenso. A quem
isso interessa?
Grupos terroristas se aproveitam da instabilidade para emperrar
não somente acordos
de paz como também o crescimento econômico da Índia, considerada,
ao lado de
China, Rússia e Brasil, uma potência econômica e política
emergente. Com isso,
poderiam continuar aliciando jovens entre minorias mulçumanas para
sua cruzada
"santa" contra o mundo ocidental.
Se por um lado a briga fortalece terroristas islâmicos, por outro
prejudica
especialmente os planos de liderança dos Estados Unidos de Barack
Obama.
Isto porque o Paquistão faz fronteira também com o Afeganistão,
outro país em
guerra que abriga milícias talebãs e a rede terrorista Al-Qaeda,
de Osama Bin Laden,
responsabilizada pelos ataques de 11 de Setembro. Para os Estados
Unidos é
fundamental preservar a cooperação entre Índia e Paquistão, para
interromper o
avanço do terrorismo e agilizar a retirada de tropas
norte-americanas do Afeganistão,
promessa de campanha de Obama.
É bom lembrar que, nos anos 80, quando foi conveniente, os Estados
Unidos apoiaram
os talebãs para expulsar os comunistas soviéticos da região, em
mais uma estratégia
que, com o tempo, se mostrou desastrosa.
Futuro incerto
O histórico de intolerância religiosa, identidades territoriais
fragmentadas com o fim
das colônias e decisões políticas equivocadas são os ingredientes
que mantém o clima
beligerante entre os países da região e nutrem o terror em todo
mundo.
O terrorismo internacional representa o avesso da globalização. Do
mesmo modo que
hoje o dinheiro percorre o mundo numa fração de segundos, podendo
derrubar, num
instante, bolsas de São Paulo e Tóquio, extremistas também agem
globalmente,
criando conflitos de difíceis soluções, como no caso da Índia.
Para combatê-los, a melhor saída é recuperar a confiança entre os
Estados. Por mais
difícil que seja esquecer o passado e conviver com as diferenças,
Paquistão e Índia
precisam retomar as conversações de paz, na esperança de encerrar
um ciclo histórico de massacres.
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